O Herói que não pode ser herói - Cap. 10
The Hero That Can’t Be A Hero
Capítulo 10: Os Heróis Aparecem
Tchieek! Tchaeeen! Beeen!
— Aaaah… pausa, por favor! — Pede Otávio.
— Pelo visto era temporário… — Darius pensa alto, com uma expressão triste. — Sentirei falta daquele Otávio. — Ele finaliza, com um sorriso provocativo.
— Até eu mesmo sinto falta… aliás, não sei se foi proposital, então valeu por não me deixar todo fodido de corpo. — Otávio agradece, enquanto joga a espada no chão. Cansado, ele vai até a borda da arena e se senta. — Mas ainda assim, pega leve, caralho! Não tô cem por cento.
Darius embainha sua espada, e anda na direção de Otávio. Ele pega a espada que o herói deixou largada e arremessa um tanto longe.
— Haha! Certo, sem problemas. Já que ganhou meu respeito ontem, você merece… porém, não se acostume. — Ele exclama enquanto se aproxima ainda mais.
Darius se senta ao seu lado, mas na areia ao invés da madeira, usando-a como apoio para suas costas. Otávio olha pro chão, se concentrando mais em respirar fundo e descansar ao máximo. Conhecendo seu instrutor, ele sabe que só terá esse breve momento para pegar fôlego, e foi um milagre até mesmo ele permiti-lo se sentar.
Já ele, Darius, está com o rosto virado para cima, parecendo admirar o céu azulado. Há algumas nuvens compondo a paisagem, mas nenhuma delas interrompe o brilho do sol da manhã. Ainda é bem cedo, apesar de já estarem na arena há mais de duas horas.
Os dois podiam agora notar o próprio mundo acordando com seus sons naturais. Darius sentiu aquele sentimento nostálgico novamente, isso era algo que fazia rotineiramente em seus tempos no exército real.
— Já faz tanto tempo… o céu está magnífico hoje. — Ele comenta. — Todo esse jardim, essa brisa suave, o calor do sol… ainda lembro bem das incontáveis horas que gastei aqui.
— Hã? Coloca brisa nisso, não é tua cara falar uma coisa dessas. — Otávio se mostra surpreso, e ri como de deboche.
— São momentos de calmaria como esse que você mais aproveita uma boa companhia. — Darius complementa.
— Humph… sai dessa, não esperava que tu fosse um apreciador de paisagens. — Otávio estava realmente impressionado.
— Para falar a verdade, existe uma relação muito forte entre nossas espadas e o mundo em volta delas. — Darius aponta. — Acho que seria bem válido para você aprender sobre isso.
— É como uma filosofia tipo “A Arte da Espada”? — Ele pergunta em tom irônico, mas quer mesmo saber a resposta.
— Não sei se eu entendi, mas permita-me explicar a teoria primeiro, quem sabe assim você não tira suas próprias conclusões? — Diz Darius. Ele limpa a garganta com uma pequena tosse.
— Um espadachim, assim como aprecia sua espada, também aprecia seu ambiente. O motivo, é porque os dois estão interligados entre si. — Ele aponta com uma de suas mãos o local do coração.
— Da Terra nascemos, à Terra retornaremos. Isso significa que estamos conectados diretamente com a natureza. Toda a vida que está à nossa volta está ligada com nosso interior, nossa alma, e por conta disso, devemos buscar um equilíbrio quase perfeito entre os dois. Essa é a filosofia que sigo, e a que ditou a forma como vejo minha espada. — Ele discursa enquanto apanha no ar uma pequena folha que estava caindo próxima dos dois.
— Como por exemplo, esta pequena folha em minha mão. — Ele a solta, observando-a cair. — Analise seus movimentos, são puros, calmos, e naturais. Um espadachim deve almejar esse nível de perfeição, buscando manter esse movimento até nos dias onde o vento estiver mais selvagem.
Otávio reflete profundamente em suas palavras, ele fica maravilhado com o jeito que seu instrutor dita seus ensinamentos. Apesar de por fora não demonstrar uma reação mais empolgada, por dentro é como se ele tivesse o desejo de pagar dinheiro vivo para escutá-lo mais.
— Essa é uma sábia analogia, porém é uma que não é fácil de replicar. Minha técnica se baseia na mesclagem de minha magia com os movimentos de minha espada, e ainda assim, possuo dificuldades. Quem me ensinou essa teoria, e me ajudou a aplicá-la em minha área foi Portgas. — Mas a simples citação ao mago quebra sua graça. Não importa a hora ou momento, seu nome sempre será pronunciado, cedo ou tarde, para o incômodo de Otávio…
— Todo mundo parece ter boas recordações desse cara… mas por que não consigo ser igual a todo mundo? — Ele interrompe Darius, com uma pergunta sincera e um gosto amargo na boca.
Darius se cala, e pensa no que falar… apesar de Portgas ser um grande amigo dele, ele também entende a posição de seu aluno.
— Eu sei das coisas que aconteceram. Você tem seus motivos, e acredito que eles sejam válidos. Mas… — Darius faz uma pausa, e agora é ele quem sente o gosto amargo. — Para ser sincero, garoto, ele não era assim. — Isso faz Otávio levantar a cabeça.
— Portgas não é mais o mesmo, ele mudou bastante nesses últimos anos, desde que voltei a trabalhar no castelo às pressas… — Ele complementa, pensando se deveria ou não falar o que está na sua mente.
— Tu quer me dizer que ele já foi algo além de um cuzão? Ainda não justifica toda essa merda que ele tá fazendo comigo. — Otávio reclama, indo direto ao ponto.
— Eu sei… ele é uma das entidades mais respeitosas que conheço, e também um ótimo amigo. Mas, desde que isso tudo começou, ele só se tornou… apático, agressivo, mas principalmente frio. — Darius se demonstra recessivo, ainda mais com o futuro.
— A cada vez que olho diretamente em seus olhos, é como se eu visse o seu “eu” do passado aos poucos se distanciando cada vez mais… — Algo intrigante passa pela cabeça de Otávio, como um sinal, e ele levanta o olhar… ele sente que o teor da conversa estava ficando interessante.
— Porém, esse não é o principal problema. Não resta muito do antigo Portgas, e o que sobrou dele está sucumbindo cada vez mais a uma escuridão completamente vazia. Talvez, no futuro… eu não consiga mais reconhecê-lo. — Darius fala em um tom infeliz, finalizando com um grande suspiro de insatisfação enquanto abaixa a cabeça.
— Minha relação com Portgas é de mestre e discípulo, e por conta do respeito mútuo entre nós, estamos sempre em contato um com o outro, principalmente no estado vulnerável que Carmine se encontra. — Otávio sente que Carmine não é nem de longe a única coisa vulnerável aqui.
— A guerra nos reuniu, mas de uma maneira miserável. As ações de Portgas, seu controle sobre tudo, e em principal, o novo jeito de sua pessoa… eu não consigo aceitar nada disso. — Otávio arregala seus olhos, “Você?! Contra Portgas? Ao menos alguém lúcido nessa porra de mundo! Mas ainda não faz sentido…” ele pensa.
— Porém, ironicamente, eu nunca sequer cheguei a mencionar uma palavra que fosse contra sua vontade. Tudo o que era me dito, eu ouvia; toda ordem, eu realizava; sem questionamentos, de modo onde eu suprimia minhas emoções. Como Portgas diz, é tudo em prol de meu país… — Darius levanta sua cabeça, o teor em que disse a última frase revela muito de seu arrependimento com escolhas passadas.
“É um discurso comum bem nacionalista… Para o Portgas falar coisas desse tipo, talvez ele seja pior do que pensei.”
— Garoto, eu não sou uma boa pessoa. Quase ninguém aqui é. Mas nem por isso devemos ficar abalados. Dar o melhor de si mesmo é a escolha certa, o fracasso dos outros não é desculpa pro seu fracasso.
— Tinha algo que eu não entendia muito bem, que sempre me questionava… mas parece que finalmente encontrei a resposta, só não do jeito que esperava. — Darius se levanta e bate na sua calça para limpar a areia.
— Não lembro quem citou isso originalmente, mas é uma citação que quando ouvi, não pude mais esquecer: “Só sei que nada sei. Logo, isso me coloca acima daqueles que sabem”, Portgas me contou em uma de nossas conversas rotineiras.
É impossível Otávio não reconhecer Sócrates. Assim como no salão com Sata, se não fosse pelo seu foco em escutar cada palavra de Darius, ele já teria respondido que isso era algo de seu mundo, empolgado.
— Sempre devemos estar abertos ao conhecimento, seja ele advindo de qualquer fonte. Um espadachim que se denomina sábio, resultará em ter seu conhecimento limitado, pois com certeza subestimará aqueles que julga não-sábio. E foi ontem, que não só aprendi como também tive certeza, que os maiores conhecimentos que você absorve em sua vida, são nos momentos que você menos espera. — Darius retira a espada de sua bainha, e a aponta para o rosto de Otávio.
“Ele disse ontem…?”
— E-epa!! Tu tá maluco, porra?! Já vamos voltar com o treinamento? — Ele fala espantado, quase caindo no chão ao ver o fio da espada bem próximo de sua testa.
— Você tem muita sorte, não sei como ainda está vivo. — Darius responde com uma frieza no olhar. “Eu tecnicamente fui morto se não sabe…” Otávio pensa. — Mas uma coisa é certa, você é especial. Não por ser um herói, mas por ser quem você é. — Ele retira a espada da sua direção, e a afunda na areia.
— Como eu disse, sou contra os ideais de Portgas, mas não tenho a capacidade de contradizê-lo. Como sempre me mantive ao seu lado, tive que suprimir minhas próprias opiniões para que pudesse agir de acordo… isso resultou em algo não muito bonito. — Darius diz, se ajoelhando em frente a sua espada, e olhando profundamente para seu reflexo em sua lâmina, que é dividido em dois.
— Era como se, aos poucos, a mesma escuridão que consumia Portgas, passasse a me consumir também… eu sempre almejei me tornar igual a ele, igual à pessoa grandiosa que era. Mas isso, isso já é demais… quando percebi, eu havia mudado. Seus ideais, eu comecei a achá-los válidos; o mal que eu causava, comecei a apreciá-lo. E eu não fazia nada para mudar isso, apesar de ter o poder nas mãos.
— Eu o respeito, muito, mas tenho receio do que possa acontecer no futuro. Daqui a pouco não poderei mais chamá-lo de amigo, porém, se tudo o que ele fez até agora só trouxe frutos para nosso país, então talvez eu só esteja sendo egoísta. — Ele se levanta e pega sua espada, limpando-a primeiro e a guardando na bainha.
“Parece que ele finalmente acabou… tem muito mais coisa rolando do que eu pensei.” Otávio decide se levantar, sua bunda já estava doendo de tanto tempo que estava sentado naquela superfície dura.
— Eu também me arrependo de várias coisas… — Otávio começa a falar. — Mas não fico pensando nelas o tempo inteiro, porque já é passado.
— A única coisa que posso fazer agora é tentar mudar, e não cometer os mesmos erros. Guiado pela ganância, eu traí um amigo precioso no meu mundo natal… acabei pagando o preço, e vim parar aqui. Um fim bem merecido, não acha? — Ele diz, frustrado, e Darius concorda com uma risada maliciosa, o que o deixa um tanto incomodado.
— No final, ainda não sei se valeu a pena ou não… é irônico pra quem morreu, acreditar que há um lado bom na maldade. Meu egoísmo me levou ao encontro da morte, mas o seu caso é diferente, é só preocupação, então relaxa um pouco, claro que isso não é ruim. — Após expor sua história, ele a usa de comparativo para confortá-lo.
— Como não? É o peso de um país inteiro contra a minha vontade. Na visão do povo, Portgas é um herói que está salvando Carmine da destruição. — Darius o interrompe. Como era previsível, seu plano de ajudar de alguma forma falha.
— Mas vocês se conhecem há quanto tempo mesmo? — Questiona Otávio.
— Isso não importa, não quando vidas estão em jogo. Não vou simplesmente trocar o futuro do meu país por um capricho meu. É uma infelicidade tudo isso estar acontecendo com Portgas, mas ainda assim, se tudo o que ele estiver fazendo for para proteger Carmine e tornar este lugar próspero, continuarei agindo de acordo ao seu lado. — Ele continua na defensiva.
— Mas não é nesse ponto que eu quero chegar. E daí que ele é uma figura super importante? Você acha que o Portgas de antes não é sábio o suficiente pra continuar tornando Carmine próspera junto de sua realeza? — Otávio insiste.
— Não é isso que eu quero dizer, mas sim o fato que—
— Então o que eu tô falando é o certo, porra! Você sabe muito bem que é o único que consegue tirá-lo dessa merda, você mesmo disse que tem o poder.
— O poder era de me tirar da merda, não ele. E ainda assim, seria um trabalho quase impossível, não vejo como eu poderia fazer ele simplesmente parar de agir do jeito que você disse.
— Como cuzão?
— Sim…
— Então significa que vale deixar ele continuar piorando, ao ponto de um dia você não poder mais chamá-lo de amigo? — Otávio questiona, firmemente. Darius franze a testa.
— Mas isso é loucura, claro que não penso assim, o que você está supondo não faz sentido. — Darius demonstra impaciência, Otávio percebe que começou a tocar num lugar delicado.
— Quem não tá fazendo sentido aqui é você, fica se culpando por algo que não é da sua conta, e quando tento te ajudar dando ideia, você fica de cu doce. Não fode, caralho! — Otávio responde em um tom alto. Os dois ficam se encarando, e se aproximam até ficarem cara a cara.
— Você não sabe do que está falando, não é como se fosse—
— Tu não tá entendendo! — Ele o corta.
— É você quem não está entendendo o que quero dizer! — O tom de Darius aumenta.
— Então porque tu não escuta a porra do meu ponto? Não é a primeira vez que vejo algo assim. — Agora é a vez de Otávio franzir a testa.
— Já dei minha palavra sobre isso, se fosse algo plausível eu concordaria com você, mas isso é fora de cogitação.
— Você tem total certeza, por acaso?
— Sim, não o conheço por décadas à toa. Se eu não tivesse, já estaria tentando há muito tempo!
— Então quer dizer que você não se importa?
— Não, não é isso, eu já te disse várias vezes, que se fosse pra—
— Você não se importa. — Os dois entram em um breve silêncio…
— M-mas é claro que eu me importo, não me pergunte o óbvio—
— Então por que tu não para de agir de assim e me escuta de uma vez—
— CHEGA! PARE DE FINGIR QUE ME CONHECE. — Darius perde o pavio, e grita.
Os dois ficam em silêncio novamente.
— Eu não te conheço. — Otávio afirma, enquanto mantém o olhar fixo no dele.
— Então por que você está sendo tão insistente com esse assunto? Talvez tenha sido um erro ter iniciado essa conversa, já nos dispersamos muito do assunto inicial. — Darius se vira, e anda na direção da espada que havia jogado na areia.
— Que cacete, não me leva a mal. — Darius para sua caminhada, mas depois volta a andar. — Tô tentando discutir essa merda contigo porque eu quero entender mais do que tá acontecendo. Não vê que tô tentando ajudar? — Pergunta Otávio.
— E desde quando eu pedi sua ajuda? — “Que desgraçado difícil, sabia que ia falar isso…”, ele pensa irritado. — Sua voz está começando a me dar raiva. Se eu fosse você, ficaria quieto. Vamos retomar seu treinamento. — Darius chega até a espada e a pega, arremessando para o lado de Otávio.
— Se você não pegá-la em cinco segundos, vou entender isso como suicídio. — Ele ameaça, e retira sua espada da bainha, se posicionando para o ataque.
Otávio continua parado.
— Cinco…
“Falar não vai convencê-lo… e agora não tem mais volta. Mas, se eu intimidar talvez…?”
— Quatro…
— Não vou repetir o que havia dito, mas se quer tanto me matar… não precisa contar. Pode vir, sem cerimônia. — Otávio o desafia, e Darius franze sua testa mais uma vez.
— Oh…? Então, que seja feita a sua vontade. — Ele para a contagem, e começa a correr rapidamente na direção de Otávio.
“Certo, preciso urgentemente pensar em algo bom! O que eu posso falar pra pará-lo?”
Ele recorda das frases de Darius, e acha o momento oportuno para fazer uso delas.
— Não sou um bom homem, isso é fato. — Otávio dita.
— Você também não é. — Ele o julga, enquanto Darius alcança metade da arena.
“Preciso demonstrar que tô confiante.”
— Mas, assim como você disse, devemos tirar o melhor da gente. — Ele dá um passo à frente, demonstrando que não vai recuar.
“Olhos abertos! Não pense em fechá-los!”
— Se eu disse tudo aquilo, é porque o motivo é simples. — Darius avança, e assim ao chegar no alcance de seu ataque, ele salta no ar, preparando sua espada.
“Foco!!”
— Eu sei que você tem o poder de mudá-lo, é por isso—
“AGORA!!!”
— Que eu confio em você!
Fwoosh~
— Arff… Arff… — Darius ofega.
“MERDA! Não deu, meus olhos…”
— Seu moleque maldito… Se quer ser tão convincente assim, é melhor manter seus olhos abertos…! Entretanto, você venceu… e pare de tremer! — Darius aceita sua derrota, enquanto Otávio lentamente abre seu olho direito.
A espada dele está parada fazendo uma linha vertical de encontro a sua cabeça, pronta para cortá-la ao meio. Otávio cai no chão, e começa a respirar fundo, de modo descompassado. Ele olha para suas mãos, que estão tremendo. Frustrado, ele cerra o punho com força.
— Droga, não acredito que estou mesmo fazendo isso… — Ele guarda sua espada, e com isso decide ajudar Otávio.
— Aah… foi bem audacioso da sua parte, garoto. Ao menos, esse é um bom começo. — Ele o elogia, enquanto estende sua mão para ajudá-lo a se levantar. Otávio recupera o fôlego aos poucos e seu estado de choque passa.
— Por um momento eu achei… que tu fosse mesmo me matar. — Ele demonstra uma mistura de medo e alívio no rosto.
— Se não fosse por ontem, quem sabe… ainda não entendo se é sorte ou se você é assim mesmo, mas acredite, é isso que está te mantendo vivo. — Darius responde, com um sorriso encorajador. Não era a resposta que Otávio esperava.
— Quê? Já é a segunda vez que você fala de ontem. Me diz, rolou alguma coisa tão importante? — Otávio acha que de alguma forma perdeu algo muito importante no dia de ontem. Para Darius exibir essas reações, algo drástico deve ter acontecido. Ele estima que estava inconsciente na hora.
— A nossa luta. — Darius responde, curto e grosso.
— Quê? Mas só foi um combate simples, não? — Otávio ainda não conseguia entender.
— Não, na verdade, vai muito além disso… — Ele faz uma pausa.
— Quando eu disse que… aquela mesma escuridão que consumia Portgas, estava de pouco a pouco me consumindo também, eu não estava mentindo. — Otávio sente que ele está mesmo falando a verdade. — Eu aprendi coisas com você ontem, coisas que me ensinaram a me livrar desse mal.
— Hã…? Eu? Como?! — Isso o deixa ainda mais confuso.
— Nessa luta, você me lembrou de algo muito importante. — Darius diz enquanto anda em direção até uma das árvores que fica perto da arena. Ele coloca a sua mão em seu tronco, e segura outra folha que estava caindo.
— Você me fez lembrar da minha história, do meu passado. Me fez lembrar de quem eu era, revivendo esse sentimento nostálgico dentro de mim. Os dias em que eu ainda era um soldado, sendo treinado por Portgas, servindo diretamente ao rei… eram tempos maravilhosos. — Ele sorri. Otávio se aproxima dele e da árvore.
— Essa árvore já existe há mais de um século. — De fato, ele não estava mentindo, os galhos estão velhos, enrijecidos, enquanto que o tronco é bastante grosso. — Foi debaixo desta árvore que Portgas me ensinou tudo o que sabia sobre a arte da esgrima. E é nesse mesmo lugar que estou te ensinando tudo o que aprendi e mais um pouco. Engraçado, não?
Otávio não tem resposta para isso, a não ser ficar observando-o, movendo talentosamente com seus dedos a folha que havia pego, simulando perfeitamente a moção em que caia, sem deixá-la perder o contato com sua pele.
— De tanto praticar, uma hora você se aperfeiçoa. O movimento dessa folha é idêntico ao de uma real. Isso foi uma das únicas coisas que aprendi sem estar seguindo meu mestre. Acho que, meu verdadeiro problema é estar sempre em seu semblante. Estive por tanto tempo, que estava me tornando igual a ele, quase no literal.
Otávio simpatiza com ele, ele conseguia lembrar muito bem de todos os momentos que passou ao lado de Léo, e numa rápida retrospectiva, se pergunta se o mesmo não aconteceu com ele.
— Eu sei muito bem como é se sentir assim… havia uma pessoa com quem eu sempre andava, e acabei ficando igual a ela, indiretamente. As marcas disso me acompanham até hoje, é isso que me impede de me tornar uma boa pessoa. Talvez eu só esteja fadado a ser assim, como se fosse uma punição divina ou algo do tipo. — Ele diz, frustrado.
— Você tem poderes que não tem ciência ainda, talvez um deles consiga solucionar isso. Imagine que me ajudar, mesmo que não tenha sido proposital, foi seu primeiro degrau. Acredito que você consiga ir longe. — Darius fala com otimismo, que era algo que raramente havia demonstrado.
— Heh… acho que no final, sou apenas um herói digno de não ser herói. — Otávio brinca, e Darius acha graça, os dois acabam rindo.
— Parando para pensar, essa foi a maior pausa que já dei para alguém durante minha carreira de professor… — Os dois se lembram de que estavam aqui em primeiro lugar pelo treinamento, e não por uma sessão de terapia. — Porém, não se preocupe com o velho aqui. Pensar fortemente nesse assunto seria um gasto desnecessário de energia para um jovem como você. — Darius complementa.
— Não vou cair na mesma armadilha duas vezes garoto, então não guarde esse assunto tão profundamente em sua alma. Mas… — Ele cruza os braços antes de terminar, abaixando sua cabeça. — Caso isso, por algum motivo bem específico e delicado, aconteça, trata de ganhar de mim da próxima vez, entendeu? Eu provavelmente não vou me segurar como da última vez.
— Olha só, mas que filho da puta… — Ele xinga, mas com um sorriso grande no rosto. — Eu sabia que você não tava usando sua força total! Droga, agora sinto que meu mérito não serviu pra nada.
— Hahaha! Não se preocupe, lutei contra você seriamente, só não fiz questão de usar meus outros truques.
— Se é você me pedindo, não tenho como negar… certo! Farei questão de chutar sua bunda na próxima vez, mesmo você usando tudo o que tem. — Otávio sente que essa é uma promessa forte, mas Darius é um obstáculo, querendo ou não, que ele terá que ultrapassar alguma hora.
Ele oferece um aperto de mãos para Darius, com o intuito de oficializar ela no estilo da Terra.
— O que significa este gesto…?
— Aqui, você segura forte na mão desse jeito, e então balança com força! — Otávio se diverte, e ensina ele como fazer esse cumprimento. Darius gostou, e achou esse cumprimento interessante, ele poderia mesmo usar isso para fins diplomáticos.
Com isso, os dois apertam as mãos, definindo de vez esse acordo.
— Huff… que discussão longa da porra. — Otávio comenta, após ter de usar sua mente além do que estava acostumado.
— De fato, mas até que a apreciei. Agora, porque você não pega aquilo que deixou cair no chão? — Darius aponta para a espada que lançou na direção de Otávio. — Já estou sentindo meus músculos atrofiarem de tanto tempo que estamos parados.
— Sinceramente, tava até sentindo falta disso. Vamos voltar logo, minha boca já tá doendo…
Com isso, Otávio retorna a sua posição na arena junto de Darius. Ele prepara sua espada.
— Cai dentro, dessa vez te acerto de novo sem precisar daquele aumento de poder! — Otávio diz, confiante.
— Quão arrogante de você, só acredito vendo. Se prepare porque vou servir seu prato favorito: a areia dessa arena! — Darius retruca com um belo insulto, rindo dele mesmo.
Otávio e Darius correm rapidamente e se encontram no meio da arena, os dois chocam suas espadas dando início a continuação de seus treinos. Durante o choque, Otávio recua, visto que o peso da espada de Darius era infinitamente maior do que a sua.
Com medo de tentar um combate direto que nem havia feito naquele estado, ele decide focar apenas em sua defesa, enquanto tenta adivinhar os golpes de seu adversário.
Voltando para o mesmo estilo de treinamento do começo do primeiro dia, eles ficam assim por mais uma hora…
—
— Aah… aah… eu… consegui! — Otávio grita, extremamente feliz, quando consegue pela primeira vez, bloquear e ao mesmo tempo contra-atacar Darius sucessivamente.
— Hoho-, nada mal… parece que você está mesmo melhorando, afinal. — Ele fala um tanto admirado, olhando para o rasgo na roupa feito bem acima do ombro.
— Finalmente algo tá vingando pra mim… — Otávio responde um tanto orgulhoso, enquanto se senta na areia para descansar depois de todo o trabalho duro.
— Um momento! Quem disse que você poderia descansar novamente? Aquela pausa de uma hora não lhe foi suficiente? — Mas, pra sua infelicidade, recebe um sermão de Darius.
— Ah, qualé, não é você que tá apanhando feito doido aqui… — Ele enfia sua espada no chão para usar de apoio e se levanta. — Pelo menos cinco minutos—
Paff-paff-paff!
Darius ignora seu pedido e começa correr para continuar seus ataques. Mas, no meio disso tudo…
— Perdão por interrompê-los. — Dita uma voz misteriosa. — Preciso da companhia de Sir Otávio, imediatamente.
Darius para e se vira na direção da voz, assim como Otávio. “HAHAHA! Salvo pelo gongo!”. A pessoa que chamou é um homem misterioso. Suas roupas não são nobres como as de Darius, então os dois reconhecem que deveria se tratar de algum serviçal da corte.
Otávio se aproxima da figura, e sai da arena.
— Uma importante conferência ocorrerá nos próximos trinta minutos. — Ele explica os detalhes. — Preciso que me acompanhe até o Salão de Beleza para prepararmos o senhor.
Ele o estranha, e Darius chega por trás.
— Novamente, deu sorte, que conveniente. Mas estimo que você já saiba o motivo, não? — Ele pergunta para Otávio.
— Motivo? Não consigo pensar em nada.
— Os heróis, Otávio! A conferência de vocês será realizada hoje, isso significa que já chegaram. — Darius passa a mão pelos cabelos, e fica surpreso como Otávio esqueceu de algo tão importante.
— Caralho!! É mesmo, puta que pariu! Caguei no pau, preciso logo me apressar… — Ele sai desesperado pelo corredor, e se pergunta como pôde esquecer do encontro com as únicas pessoas que poderia se familiarizar nesse mundo.
— C-com calma, senhor Herói! Este é o caminho errado! — O serviçal vai correndo em sua direção quando perde Otávio de vista.
— Puxa vida… melhor eu me adiantar também, apesar de tudo, tenho certeza que ele irá se atrasar. — Em seguida, Darius também se retira do local da arena.
—
Aproximadamente 40 minutos se passaram. Ao seu lado, se encontra o serviçal Reinald que o ajudou a se preparar para o encontro, e também a localizar a sala do trono. Os dois encaram a enorme porta fechada, e sons das vozes de outras pessoas do outro lado dela.
Ele estava nervoso, muito nervoso. Seu coração bate em um ritmo bem acelerado. Apesar de ele estar apresentável, são muitas variáveis que o fazem se sentir ansioso.
— Estarei indo em frente, para anunciar a sua chegada. Esteja preparado quando eu mencionar seu nome, e após isso, ande e fique ao lado dos outros heróis. Quando o rei fechar seu punho, não se esqueça de ajoelhar. — Reinald diz os últimos preparativos.
As roupas que Otávio usa são refinadas, apesar de serem um pouco grandes, ele amou o estilo. Uma jaqueta blazer predominantemente branca com linhas de cor amarela no estilo vitoriano, e uma capa azul, além de cachecol de mesma cor.
Em sua cintura há uma espada decorativa com uma decoração gloriosa no punho. Feito para representar o símbolo de um herói, ela está guardada numa longa bainha com ornamentos em ouro.
O serviçal atravessa a porta, e a fecha em seguida. Otávio consegue escutar sua voz pronunciando um pequeno texto antes de enunciar sua entrada.
Tum-tum! Tum-tum!
— Eis então, vosso último Herói, Sir Otávio!
As portas se abrem, e Otávio entra, recebido por uma salva de palmas. Todos estavam encarando-o, parece que todos os nobres do castelo se reuniram para esse evento comemorativo.
A sede do castelo é de longe o lugar mais belo que ele já tinha visto. O piso, apesar de feito dos mesmos materiais que o corredor do castelo, tem um tipo de cor reluzente, mais dourada, além de reflexos mais perceptíveis.
As paredes são completamente brancas, mas sua textura é um tanto espessa, desviando da suposição delas serem feitas de gesso. O teto é sustentado por várias colunas construídas estrategicamente, de um jeito que forneça a resistência necessária, e posicionadas em locais onde não atrapalham a movimentação alheia.
Mas o principal, que atrai a atenção quase completa de Otávio, são as escadarias que levam ao trono. Feito à base de ouro, conta com uma grande poltrona extravagante no meio, revestida com um couro de cor vermelha. Ennard, que está sentado, levanta a mão para Otávio, um sinal que indica que o herói poderia prosseguir com sua caminhada.
Ao lado direito de Ennard, na visão de Otávio, está Sata. O principal motivo de seu olhar desviado, dentre todos esses nobres e heróis, é ela quem chama sua atenção. Graciosa como sempre, o vestido da vez é parecido com o último que ele tinha visto ela usando. Branco, com várias listras douradas e botões de prata, é um vestido longo até os pés, que parecia feito para bailes e eventos formais.
Seus olhos se encontram, e no mesmo instante, Sata vira o rosto pro lado. Isso faz ele sentir uma certa aflição.
Tum-tum! Tum-tum! Tum-tum!
E é claro, não poderia faltar. Ao lado esquerdo de Ennard, se encontra Portgas, trajando um robe diferente do seu usual. É do mesmo tipo que usou quando invocou Otávio: longo, predominantemente branco e bordado a ouro, mas sem capuz.
Otávio começa a andar, finalmente, indo se encontrar com as quatro figuras principais, localizadas no centro do salão, ainda no tapete vermelho. No caminho, ele também nota seu instrutor Darius, trajando a mesma vestimenta de quando o viu pela primeira vez.
Os presentes heróis estão vestidos adequadamente, com roupas parecidas às de Otávio, com exceção apenas de um, que parece vestir um terno. São três homens e uma garota. Quase todos são jovens, enquanto um deles parece um adolescente por sua baixa estatura.
Otávio está nervoso, tão nervoso que ele pensa nos passos que dá no tapete, se esforçando para parecer o mais formal possível. Os nobres cochicham.
Ele para ao lado das outras figuras, que o encaram por um momento, mas voltam sua atenção ao rei novamente. Ele está ansioso, como se seu coração fosse saltar pela boca. O rei levanta sua mão novamente, e então fecha o punho.
Todos os heróis se curvam, assim como lhes foi dito.
— Agradeço a todos os nobres presentes hoje neste salão, para uma conferência de grande importância que entrará para a história. — Ennard exclama, recebendo outra salva de palmas. — É neste momento, que dou início à criação definitiva da Comitiva Heroica, sob os comandos de nosso fiel e mais poderoso mago, Portgas L’bër!
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Comentários em Cap. 10
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